Dia #25

Maio 23, 2010

O casal chama a atenção. Não porque quer, mas porque estou atenta. O cabelo, rapado nas margens para o deixar tigelado, com um pequeno tufo mais longo do lado esquerdo, atrás da orelha, é a primeira característica que salta à vista. Segue-se a camisola larga, solta sobre o corpo, o anel no lábio à direita, a língua possivelmente furada e a tatuagem circular no cotovelo esquerdo, que surge quando o calor aperta e a roupa se despe. Seguem-se os gestos.

O olhar não desprende da rapariga que acompanha, de tal forma que não se apercebe da atenção que lhe dedico, a pouco metros de distância, a um curto desvio do olhar. Logo que a oportunidade surge, o polegar escorrega pela sobrancelha dela, possivelmente encenando uma limpeza casual de algum incomodo. Noutro momento, cruzam-se os dedos sobre a mesa e servem os pontos de contacto para alguma troca de mimos.

Na mesa em frente, de costas para o casal, alguém culpa o americano gay emigrado em Portugal de ter dado início a este deboche, porque eles agora querem tomar conta disto tudo, esses gays, que não fazem evoluir a espécie, são estéreis, que com eles a sociedade morre.

Indiferentes à indignação, as duas raparigas permanecem de olhar fixo, ouvido mouco e coração entregue.

Comigo: How Soon is Now – The Smiths